Monday, October 15, 2007

GENTES DO SEU TEMPO


Nem sempre as estórias nos passam pela porta. Ao lado talvez, pelas esquinas e janelas entreabertas – um sussurro – de quando em vez. São gentes, que vieram antes da história começar a paginar-se lenta e precisa. Nesta senda, Toronto fez-se Arca de Noé, oasis para os sonhos, nem sempre esculpidos de certeza. Mas a História cumpre-se através da intrínsica capacidade humana de projectar a utopia. Assm somos nós as lusas, que reorganizando o universo feminino tradicional, vão expandino a quimera, rumo ao universo das realizações humanas.
No silêncio de cada lar, a mulher portuguesa foi condensando nomes e estórias numa luta que fica sepultada no anonimato. Com a lacra do silêncio, as suas vitórias foram-se consumindo na nudez das palavras por falta de tempo. Aqui e ali algumas ressuscitam dos passados recentes, para iluminar os atalhos das nossas vivências. Melba Dias Costa, não faz parte do meu universo geográfico de infância, mas penetrou no meu dia, com a serenidade de um ser, que cumpriu a sua estória tornando mais rica a História das mulheres lusas nesta província. África talhou o indivíduo, como o vulcão esculpiu a ilha. O continente quente das savanas rasgou no africano a identidade, como o mar a perder de vista selou o destino do ilhéu. Uma rota extradordinária na vida da primeira mulher médica portuguesa na comunidade. Filha de Moçambique, conheceu Portugal, França, Angola, Estados Unidos e Canadá. Trabalhou na Organização Mundial de Saúde, foi galardoada com a Comenda da Ordem de Mérito, trabalhou com um dos grandes nomes da oncologia portuguesa Gentil Martins e, dedicou parte da sua vida à comunidade portuguesa de Toronto. Na década de 40, altura da sua formatura pela Faculdade de Medicina de Lisboa Melba, a mulher, a africana, a progressista conheceu os preconceitos de um país conservador e fascista como o português. Foi mesmo vigiada pela polícia portuguesa do regime: a PIDE. Como escreveu o seu filho: ”Ela desafiou as expectativas sociais para as mulheres do seu tempo, em busca de objectivos profissionais, ao invés de se confinar à vida do lar. Partiu sozinha para os Estados Unidos, e mais tarde para o Canadá, abrindo caminho para que a sua família a seguisse anos mais tarde”. A médica Melba Dias Costa é um exemplo a seguir pelas jovens luso-canadianas. Um exemplo reconhecido pela imigração canadiana que destacou o seu nome no Museu Pier 21, em Halifax.

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