Thursday, February 19, 2009

Cantou sim! Mas para portugueses




A cantora portuguesa Mariza parece ter uma missão na vida como artista: mostrar aos estrangeiros o Portugal de hoje. Um país de orgulho, de ricas tradições culturais e que em nada fica atrás dos outros. É este Portugal que a cantora se vê na “obrigação” de levar mais longe.
A artista também reco-nhece, que os portugueses talvez se venham a sentir um pouco magoados, com uma das suas verdades: «Eu não trabalho muito para as comunidades portuguesas».
E tal compreende-se, pois a artista não é só uma voz portuguesa acarinhada pelos portugueses a viver fora, moldados pela saudade. Mariza mostrou em Toronto ser sobretudo, um produto dos tempos em que vive moldados pela internacionalização da cultura e dos espaços que vai conhecendo, das vozes com as quais vai comungando melodias e de uma perspectiva nova, que passa por um Portugal a-berto, moderno.
Mariza é também o resultado da disciplina e da profissionalização fórmulas para vencer e para arrancar um lugar junto das me-lhores vozes da música internacional de hoje. Mariza é sem suspeita uma diva, que conhece os limites e os horizontes do "marketing", da imagem, da Internet e da globalização.
Foi para mim, como decerto para um Massey Hall cheio, uma noite para não esquecer.
Depois da entre-vista, o espectáculo. Um apreciar de diferentes fa-cetas da artista num palco maduro, onde foi possível reconhecer sons da grande comunidade de língua portuguesa, onde o fado foi mais além numa caminhda que se expande, levando consigo o sentir luso a outras paragens e bebendo delas outros horizontes e musicalidades.
Mas diga Mariza o que disser. Em Toronto, Mariza cantou para os portugueses, pois embora teimasse dirigir-se ao público em inglês, a língua era sem dúvida a portuguesa e o português, foi sem dúvida aquele público fiél que encheu o Masey Hall.

“A minha voz terá sempre fado”



Mariza esteve em Toronto, não para cantar para os portugueses - embora reconheça sejam uma presença carinhosa pelas cidades onde passa - mas para os locais. Assim tem sido nas suas tournées pelo estrangeiro. 
"Quero mostrar Portugal a outras culturas, mostrando que nós em nada somos pequenos, que Portugal tem muitos valores e muito para oferecer. Dar a conhecer este Portugal só se pode fazer mostrando-o ao público local». Depois do seu espectáculo em Toronto, a cantora portuguesa partiu para Chicago, para no dia seguinte regressar ao Canadá, para mais uma actuação em Montreal. O encontro da jornalista com a cantora deu-se no café de um hotel da baixa de Toronto. Visivelmente “perturbada” pelo frio, numa tarde em que começávamos, nós, a saborear uma brisa primaveril prematura, Mariza prosseguia a sua agenda de entrevistas. 
“A minha voz terá sempre fado porque eu cresci num bairro muito típico, o da Mouraria, onde toda a gente canta e, se não canta, tem uma forma de estar muito fadista”. Palavras da cantora, que assim se revela aos portugueses, nesta sua digressão à América do Norte, onde dá a conhecer o seu último trabalho discográfico “terra”.
“A minha alma terá sempre fado. Só que quanto mais viajo e muito mais conheço o mundo, mais a minha música se transforma”. 
“Quanto mais pessoas e culturas vejo, quanto mais músicos conheço e com quem trabalho, quanto mais tento entender o mundo à minha volta, mais sou influenciada como cantora, como pessoa e como mulher. Tal, acaba por aparecer na música que faço. Ela não fica estática, pois é uma música orgânica, uma música que tem movimento.”
Este um movimento que reflecte também as transformações por que Lisboa passa. “Ao mesmo tempo Lisboa é uma cidade que está em constante movimento, uma Lisboa que tem uma geração nova, enquanto ao mesmo tempo quer preservar a sua cultura e as suas tradições e mostrar que faz parte de um Portugal novo, de um mundo novo, de uma família nova. Neste processo mostra que em nada somos uma cultura menor. Em nada somos menores. Muito pelo contrário. Nós temos uma cultura muito rica, começando pelos nossos escritores, poetas pela nossa própria música e pelo fado que é um dos grandes representan-tes da nossa cultura.”
Um desabafo rico de quem não esquece também as suas raízes africanas. «Não tenho grande afinidade com a cultura africana…ainda. Espero poder mais tarde estudar melhor esta faceta. Mas acho que preciso crescer mais um bocadinho como pessoa, para começar a entender este meu outro lado, o lado das minhas raízes africanas. Afinal, saí de África com 3 anos. Toda a minha vida foi vivida em Lisboa, na Europa. Viajar significava ir para Espanha, França ou Alemanha. Pouco ou nada para o continente africano. Este é um processo de conhecimento que vai demorar um pouco para entender este lado das minhas raízes.» 
Quanto às comunidades a cantora é peremptória. «Olhe, tenho que ser muito sincera. Eu não trabalho muito para as comunidades portuguesas. Se calhar vão ficar um pouco zangados comigo, com certeza. Mas quando vou a uma cidade, como por exemplo a Toronto onde existe muitos portugueses, a comunidade aparece. O mesmo acontece quando vou a Franca, Suíça ou ao Luxemburgo. Mas normalmente eu trabalho para o público local. Obviamente, que adoro receber o público português, que é extremamente carinhoso, e educado que já tenta entender que o fado que canto tem uma personalidade muito própria, muito minha. Todavia, o que eu quero mesmo é mostrar Portugal a outras culturas, mostrando que nós em nada somos pequenos, que Portugal tem muitos valores e muito para dar. E isto só se pode fazer porque já conhecemos o que somos. Mostrar este Portugal só se pode fazer mostrando-o ao público local. E como trabalho normalmente com agentes locais, muitas vezes também não chega às comunidades que estou em determinados auditórios.» 
À derradeira e inevitável pergunta: «Considera-se uma fadista?»
A resposta seria categórica. Não! Sou uma cantora portuguesa!»

Amante da cultura e da língua portuguesas, Mariza vê com bons olhos um acordo, que unifica a língua portuguesa. «O acordo ortográfico teria que acontecer. A língua brasileira é neste momento muito mais forte que a nossa. Veja-se, por exemplo nos Grémios Latinos, onde já fui nomeada duas vezes. Se eu fosse brasileira talvez tivesse ganho. A música brasileira tem muito mais força, e é muito mais conhecida nestes mercados A música portuguesa não. Algumas coisas, que fazem parte do nosso português mais antigo, vamos perdê-las, com certeza. Mas por outro lado também vamos ganhar. 
Temos que olhar para as coisas sempre como um pau de dois bicos: um lado positivo e outro negativo. Também ganhamos muito porque pertencemos a uma língua que é falada por milhões de pessoas. E isto, para nós é extremamente importante. Este acordo dá uma dimensão à nossa língua, que vai ter impactos positivos, sem dúvida a nível económico e abrir portas à nossa cultura.»
O próximo passo?
«O concerto de amanhã.»

O último CD de Mariza «terra» contou com grandes nomes da música internacional, nomeadamente do cabo-verdiano Tito Paris, da afro-hispânica Concha Buka, do brasileiro Ivan Lins ao piano, assim como dos cubanos Chucho Valdês e Ivan Lewis, para além dos espanhóis Javier Limon na guitarra flamenga e Piraña percussionista. A tornar este um trabalho internacional há a registar a participação de Dominique Miller, guitarrista a trabalhar com o cantor inglês Sting, há duas décadas. De «Fado em Mim» editado em 2001, a « terra» vai um caminho de sete anos que sem dúvida traçam um caminho de maturação artística e abre uma porta para o delinear do futuro caminho da cantora. Ela própria o diz. «Em sete anos consecutivos de tournée internacional, além de levar a minha música, fui tendo contactos com culturas e estéticas diferentes. Fui ouvindo e entendendo. Fui assimilando até chegar aqui.» 
E se pretender apreciar esta nova etapa da cantora, nada melhor que ouvir «terra», caso de não ter tido a possibilidade de assistir a um espectáculo a não esquecer.

Humberta Araujo
Fotos: H.A.

Friday, January 23, 2009

"Nós somos muito individualistas"


A comunidade precisa de se unir

De malas feitas para Copenhaga, o embaixador de Portugal em Otava dá uma entrevista exclusiva ao CRA. Fomos encontrar João Pedro da Silveira Carvalho em Toronto na companhia dos deputados portugueses na Organização para a Cooperação e Segurança Europeia e do presidente da Assembleia Parlamentar João Soares, aquando da última reunião da OSCE. 
Para substituir Silveira Carvalho o governo escolheu Moutinho de Almeida, que desempenhava as funções de cônsul geral em Macau. Neste seu adeus aos portugueses no Canadá, Silveira de Carvalho faz um balanço do que foram as suas prioridades junto da comunidade e faz uma análise do estado da comunidade, que considera ainda aquém das suas capacidades, em parte porque os portugueses não trabalham em equipa. "Nós somos muito individualistas. Nós não somos educados para um trabalho de grupo e isso tem as suas consequências." Da sua permanência na província do Ontário, o Embaixador faz um balanço positivo e realça aquelas que foram algumas das suas prioridades. 

João Pedro da Silveira Carvalho -"A minha primeira prioridade foi ajudar a comunidade a participar cívica e politicamente. Para isso e, passados 15 dias depois da minha chegada a Otava em 2003, reuni em Toronto com os diferentes membros da comunidade, que já tinham alguma experiência política, nomeadamente na Câmara Municipal e outros que já se tinham candidatado, mas que não tinham sido eleitos. Este encontro surgiu no sentido de encorajar a comunidade a uma maior participação. O balanço é bom. Espero ainda que nestas próximas eleições a comunidade portuguesa consiga ter mais eleitos de origem portuguesa. Porém, já conseguimos na realidade pela primeira vez ter um deputado ao nível federal. Temos actualmente dois a nível provincial aqui no Ontário. Neste sentido e em termos de participação política já algum passo foi dado durante esta minha permanência aqui.
Esta foi a minha primeira prioridade. A segunda foi a da criação de um "lobby" económico na comunidade. Foi meu intuíto reunir com a Federação dos Empresários, e a Academia do Bacalhau onde estão muitos empresários e profissionais portugueses. Vim encontrar-me com eles porque acho que a comunidade tem que influenciar as decisões a partir da criação de um "lobby" o que só vai ser possível quando para os canadianos for evidente que os portugueses representam alguma coisa de relevante economicamente neste país. Nesta ordem de ideias tentei reavivar a antiga Câmara do Comércio de Toronto, cuja patente está com a Federação. Infelizmente não consegui este objectivo".

HA – Portanto e de acordo com o seu ponto de vista, parte do insucesso de algumas iniciativas deve-se ao facto da comunidade não se ter apercebido da importância da criação deste tipo de grupo de pressão?
JPSC -  "Mesmo a criação de uma representação política, que não tenha por trás de si algum apoio financeiro é muito difícil de se manter. A comunidade tem de entender que esta é a única forma da mesma vir a ter no Canadá uma maior exposição e reconhecimento. Os portugueses são reconhecidos como trabalhadores, honestos, mas nós temos que subir um degrau. E este degrau é o degrau da cidadania. Para isso necessitamos de mais pessoas eleitas; temos que ser visíveis para os canadianos, mostrando que temos algum poder económico. Temos que ter uma participação cívica activa, pois só assim a nossa comunidade pode mostrar aquilo a que tem direito, face ao número de pessoas que somos e ao nível de desenvolvimento que já atingimos."

HA - Os portugueses que emigraram nunca foram indivíduos de grande participação cívica e política. Acha que só a educação dos mais novos poderá contribuir para a mudança do "status quo"?
JPSC- "Toca aí num aspecto que também sempre foi minha preocupação. Em todas as oportunidades que tive sempre pedi aos pais que levassem os filhos o mais longe possível na educação. Porque só assim conseguiremos que as gerações mais novas tenham acesso ao poder decisório no Canadá. Nós não podemos adiar esta filosofia. Provavelmente já antes de mim este esforço deveria ter sido feito no sentido de apoiar a comunidade. O embaixador, os cônsules não têm que fazer uma política sua. Temos sim que apoiar a comunidade para que ela alcance os objectivos que ela definiu como os seus próprios. Eu tentei apoiar a comunidade nestes sectores, nomeadamente o da educação. Foi sempre um dos aspectos que eu referi nas minhas mensagens. Eu sei que é fácil aliciar os jovens a ganharem uns dólares, ajudando os pais. Acho esta atitude compreensível. E esta é a experiência portuguesa. Mas alertei as famílias para o facto de os filhos ao abandonarem os estudos muito cedo deixam de ter capacidade de alcançar postos de trabalho mais qualificados.

Língua portuguesa

HA- Um outro assunto que sempre preocupou o embaixador foi o da protecção e promoção da língua portuguesa
JPSC - A comunidade é que verdadeiramente tem mantido o português vivo. A verdade é essa, nomeadamente o associativismo a quem manifesto o meu agrado pelo trabalho desenvolvido na conservação da cultura e das tradições, mas também da língua, porque elas são o espaço onde se fala o português. Aqui no Canadá vim aperceber-me de um facto muito curioso: apesar de muitas vezes os pais falarem com os filhos em inglês, os jovens não se importam de comunicar com os avós em português. Esta é uma forma muito curiosa dos jovens manterem a língua.

HA - O ensino da língua portuguesa no sistema escolar oficial do Ontário persiste nomeadamente através dos programas de línguas internacionais. Acha que o governo português deveria apoiar estes programas provinciais?
JPSC- Para lhe ser totalmente sincero acho que Portugal deve apoiar qualquer programa que vise a preservação da língua no Canadá ou em qualquer país onde haja comunidades portuguesas. A nova política que o governo quer implementar ainda não é totalmente conhecida no que diz respeito ao ensino no estrangeiro. Como se recorda, vários governos anteriores a este anunciaram medidas de apoio para as associações que ensinassem português, para além de outras medidas, as quais nunca viram a luz do dia. Por consequência, e desconhecendo o conteúdo da nova política, não me quero pronunciar sobre como esta política se poderia articular com os conselhos executivos das escolas onde se ensina a língua portuguesa no Ontário.”

Comunidade dividida

HA - Apesar de já cá estarmos há cinquenta anos a verdade é que a nossa visibilidade pode ainda ser considerada diminuta. Qual a sua opinião?
JPSC – "A visibilidade da comunidade tem sofrido por causa da falta de união entre os portugueses da comunidade. Para lhe ser franco e do meu ponto de vista os portugueses no Canadá são como todos os portugueses em qualquer parte do mundo. 
Nós somos muito individualistas. Nós não somos educados para um trabalho de grupo e isso tem as suas consequências. Cada um vai para seu lado e assim é difícil sermos uma equipa. Tentei aqui muito mudar esta mentalidade e sobretudo ao nível económico. 
Eu posso dizer que vi imensos empresários e todos estiveram sempre disponíveis para falar comigo. O encontro em que eu reuni mais pessoas só consegui oito, num imenso universo de portugueses de sucesso e capazes. Mas estes pequenos problemas existentes entre uns e outros só prejudicam. 
A questão educacional também não ajuda. Infelizmente, esta é uma herança também. Em Portugal nunca fomos educados para formarmos uma equipa e de percebermos que como equipa conseguimos obter resultados mais duradoiros do que ao nível individual. Somos muito individualistas e muito donos do nosso próprio sucesso. Não partilhamos com os outros."
HA - Acredita que esta forma de ser tem também impacto negativo nas gerações mais jovens?
JPSC - "É o sangue que nos corre nas veias."

HA - Fale-nos um pouco do seu futuro profissional?
JPSC - "Eu vou para embaixador de Portugal em Copenhaga. Vai ser um passo estimulante, apesar de ter sido uma actividade que já fiz na Irlanda.
Não terei uma comunidade portuguesa como aqui, pois o número de portugueses é muito restrito. Vou sobretudo acompanhar os dossiers da União Europeia, algo do qual tenho algum conhecimento porque fui Director-Geral para a União Europeia na anterior presidência portuguesa. Para me substituir vai ser transferido de Macau o cônsul Moutinho de Almeida."

“Este foi um grande momento que vivemos em Toronto”



Toronto foi palco de uma importante reunião internacional no passado mês de Setembro que trouxe a esta cidade diversos parlamentares membros da OSCE – Organização para a Segurança e Cooperação na Europa e, cujo presidente do seu parlamento é o português João Soares, ex-presidente da Câmara Municipal de Lisboa e filho de Mário Soares. 
A OSCE é um organismo que promove o diálogo e a cooperação entre estados e, dela fazem parte parlamentares de 56 países. Nesta reunião o tema central foi o conflito entre a Federação Russa e a Georgia. “Um encontro positivo pois foi o primeiro do género depois do início dos confrontos de Agosto". 
João Soares, que foi eleito para o cargo em Julho, é uma cara bastante conhecida dos emigrantes, pois entre outros foi presidente da municipalidade lisboeta, uma cidade muito querida para os emigrantes no Canadá. E a emigração não é um tema ao qual esteja alheio. 
“Temos que ter orgulho nas comunidades que temos espalhadas pelo mundo”, disse João Soares.
O tema desta reunião de Outono centrou-se em torno da “OSCE num Mundo sem Fronteiras: Comércio, Segurança e Migração”. A dimensão mediterrânica da OCDE, a economia, meio ambiente, direitos humanos, migração foram outros dos muitos temas do encontro. Na ordem do dia esteve contudo a crise na Geórgia. Com representantes da Federação Russa e membros do governo da Geórgia, nomeadamente a ministra dos Negocios Estrangeiros Eka Tkeshelashvili e membros da oposição da Geórgia, este foi o primeiro debate entre as partes desde o conflito iniciado no dia 8 de Agosto. 
Em declarações exclusivas ao Nove Ilhas, João Soares mostrou-se satisfeito pela forma como decorreram os trabalhos. “Pela primeira vez depois do conflito ambas as partes puderam trocar ideias e todos os parlamentares tiveram oportunidade de apoiar no esclarecimento da situação”. Posições diferentes e de certo modo cautelosas ouviram-se sobre este conflito, que para muitos marca o ressurgimento de atitudes imperialistas por parte da Rússia, que acusa a Geórgia de ter sido o motor do conflito.
De acordo com um relatório de um grupo internacional de observadores “no dia 7 de Agosto de 2008 os militares da Geórgia usaram força indiscriminadamente e de forma desproporcional resultando na morte de civis no sul da Ossetia. Os militares russos desde então têm usado força de forma indiscriminada no Sul da Ossetia e no distrito de Gori e aparentemente têm escolhido como alvos comboios de civis que tentam fugir das zonas de conflito”.
A iniciar o seu mandato como presidente da Assembleia Parlamentar, a OSCE e João Soares viram-se assim confrontados com o acordar de um dos chamados “frozen conflicts-conflitos congelados” naquela região.
“O quadro de responsabilidade que é o meu e que resulta da eleição de Julho passado é o de Organização de Segurança e Cooperação na Europa na sua vertente parlamentar. Estamos a falar de 56 países de Vancouver a Vladivostok, um território vastíssimo. Estamos a falar da mais larga organização de cooperação e segurança regional que existe no mundo logo a seguir às Nações Unidas. As questões que este território se confronta são conhecidas e, têm a ver com três grandes áreas onde tem havido problemas: os Balcãs, o Caucaso e a Ásia Central. Desta vez fomos confrontados com uma situação inesperada num dos chamados conflitos congelados do Caucaso.” Para João Soares está hoje “razoavelmente apurado” que a primeira iniciativa neste confronto numa escala convencional foi da parte da Georgia que deu origem a uma resposta por parte da Rússia. 

“Alguma coisa de muito substancial já foi conseguida que é o cessar fogo. Há um quadro negocial, onde acho que eu tenho tido um papel muito importante, que passa pela colocação de observadores no terreno e nos territórios da Ossetia e da Abkhasia.” Recorde-se igualmente que por iniciativa do actual chefe de estado francês e presidente da União Europeia, Nicolas Sarkosy negociou com a Rússia a colocação de 200 monitores-observadores da União Europeia na fronteira entre a Georgia e a Ossetia do Sul e Abkhasia. Tal representa, segundo Soares “ um reconhecimento “de facto” da independência destes dois territórios e traz um contributo da UE na fiscalização dessas fronteiras.” 
Nesta ordem de ideias, João Soares salienta que o papel da OSCE é muito mais numa lógica de intervenção no terreno dentro destes territórios. Para o presidente do parlamento vai continuar a existir jogos de força no plano internacional entre quem reconheceu a independência destes territórios e não se viu acompanhado. Existe “um factor de complexidade adicional com o facto da Rússia ter reconhecido a independência destes territórios e, com a imposição que começa a ser feita por parte da Russia de que as autoridades da Ossetia do Sul e da Abkhasia sejam também ouvidas em tudo quanto tem a ver com estes rterritórios”. 

Para quem esteve presente nos trabalhos foi patente o apelo de todos os parlamentares de dentro e fora da região para a necessidade de diálogo para que as populações não sofram mais.
“Algum diálogo já começou aqui em Toronto. Nestas coisas o caminho faz-se caminhando e à medida que se vão dando os passos é que se consegue estar mais próximo daquilo que são os nossos objectivos que é a segurança e a cooperação numa região tão vasta da Europa. Quando se promove o diálogo como se promoveu aqui cria-se uma oportunidade para que as pessoas e as diferentes posições sejam ouvidas. Este foi um grande momento que aqui vivemos e único desde que o conflito começou nunca as partes tinham estado juntas nestas condições. 
Esta reunião em Toronto, cujo anfitrião foi o Parlamento Federal, contou com a presença de um número recorde de parlamentares: cerca de duzentos representantes de 49 países da OSCE. 

Lisboa de hoje
Agora em Copenhaga, João Soares reserva um espaço especial para a sua Lisboa que é também a cidade de muitos emigrantes no Canadá. “Lisboa continua a ser uma das cidades mais lindas do mundo e tem muitas semelhanças com Toronto no sentido que é também uma cidade cosmopolita, onde se encontram várias comunidades vindas de muitos pontos do mundo. Evidentemente que para todos nós portugueses sermos do continente ou das regiões autonomas Lisboa é sempre uma referência maior da nossa terra. Já não tenho responsabilidades em Lisboa. É um capítulo que encerrei do ponto de vista pessoal, mas continuo a ser um lisboeta cada vez mais apaixonado pela minha cidade.”



Valorizar a emigração 
“Eu acho que este governo está a fazer um eforço significativo no sentido de valorizar o papel que a emigração sempre desempenhou ao longo da nossa história. Nós sempre fomos um país de emigrantes mas agora somos tambem de imigrantes. Temos que ter orgulho nas comunidades que temos espalhadas pelo mundo. A única vez que vim a Toronto foi na década de 80 a convite da Casa do Alentejo. Não esqueço este convite pelo qual estou muito grato. E sempre que me desloco a qualquer país do mundo faço sempre questão de visitar as nossas comunidades”, disse ainda ao Nove Ilhas João Soares.
Fizeram parte da delegação portuguesa nesta reunião da OSCE os deputados António Almeida Henriques, Maria Antónia Almeida Santos, Luis Campos Ferreira, Osvaldo Castro, Jorge Morgado, Isabel Pires de Lima e José Soeiro e Nuno Paixão do secretariado.

Entrevista e fotos:
Humberta Araújo

O Trabalho do Bom Pastor no Quebeque


Não sou indiferente à instituição do Bom Pastor. Desde muito jovem, que ouvi falar do Bom Pastor, que durante algum tempo, cuidou de uma familiar minha, em S. Miguel. Na década de noventa, vi-me de novo transportada para o mundo do Bom Pastor, aquando das filmagens de “Gente Feliz com Lágrimas”. O edifício do Bom Pastor foi o palco escolhido pela RTP/A para a adaptação da obra do escritor açoriano João de Melo, na qual tive o prazer de interpretar um pequeno papel. Para além da experiência de contracenar com o colega e realizador Zeca Medeiros, tive a oportunidade de conhecer de perto o belo imóvel do Bom Pastor. Os seus quartos, os jardins abandonados, os fornos, a lavandaria, os seus corredores e as suas belas janelas. No seu todo, davam uma imagem, ainda que diminuta, do que teria sido a vida naquele imóvel durante os seus anos de ouro.
O Bom Pastor veio de novo ao meu encontro numa recente visita que efectuei à cidade do Quebeque, sem dúvida a jóia da coroa canadiana. Para além da beleza extraordinária da cidade, onde é possível descobrir em cada esquina o orgulho, o patriotismo e o amor dos franceses do Quebeque, a velha cidade descobre-se por entre um intrincado de histórias da História que fazem este país. 
A existência de um museu dedicado à obra do Bom Pastor no Quebeque, foi uma admirável descoberta, que não só me permitiu uma ligação emocional à instituição nas ilhas, mas abriu -me uma janela para o real conhecimento do Quebeque do século XIX. A vida e obra da sua fundadora Marie-Josephte Fitzbach (com alguns paralelos a Teresa da Anunciada e o Convento da Esperança em Ponta Delgada) - ambas com um dossier no Vaticano para beatificação – centraram-se sobretudo no trabalho junto das prostitutas, que abundavam numa localidade devastada pela pobreza, incêndios, mercadores, marinheiros e imigrantes. Este trabalho estendeu-se inevitavelmente ao apoio a mães solteiras e presidiárias. A missão de apoiar “mulheres” perdidas contou com a oposição de alguns dos mais importantes nomes da vida pública da época, alguns membros da Sociedade São Vicente de Paula. Mas foi apadrinhada por um visionário e membro da sociedade: George Mainly Muir. Entre 1850 e 1860 o seu esforço levou à criação de algumas infraestruturas de apoio às mulheres: casas de abrigo e uma prisão. Marie Fitzbach ficou responsável pela gestão destes serviços, criando a instituição do Bom Pastor em Quebeque. A sua figura é hoje venerada na província e, são hoje muitos os milagres, atribuídos a Marie Fitzbach. Para além desta dimensão religiosa, Quebeque tem ainda a agradecer ao Bom Pastor e às mulheres que serviram a comunidade, o grande número de edifícios históricos construidos e utilizados pela instituição, hoje riqueza patrimonial do país. 
Neste pequeno contributo do NI ao Bom Pastor, fica um agradecimento especial à irmã Claudette Ledet, responsável pelo Museu e uma guardiã deste património de valor inegável. Ainda hoje o 14 da rua Couillard, no Velho Quebeque apoia mulheres e idosos, cumprindo a missão instituída pela sua fundadora. O Bom PAstor do Quebeque tem hoje uma presença forte no continente africano e Brasil.
H.Araujo

Banif/Açores "Poupanças

"Os Emigrantes podem estar descansados “Somos um banco conservador e por isso as poupanças estão seguras.Pelas garantias intrínsecas do funcionamento e do conhecimento que temos da nossa organização os emigrantes podem confiar que as suas poupanças estão garantidas. Poupanças que estão igualmente seguras na sequência da garantia total dada pelo estado português sobre todo o sistema financeiro em Portugal.” 
Esta a certeza dada em Toronto pelo responsável da Unidade de Negócios do Banif, que nesta cidade encetou contactos directos com a comunidade portuguesa. A emigração desde sempre representou uma parcela importante para os negócios bancários. Representações históricas continuaram a relação entre o emigrante e o país de origem. Uma destas instituições bancárias foi a BCA, que após a privatização passou a chamar-se BANIF e que junto da comunidade açoriana ficou conhecido como o BANIF/ Açores. A representação do BCA-BANIF Açores "para conhecer melhor os seus clientes" deslocou-se ainda a várias representações do BANIF na América do Norte. 

H.Araujo

Wednesday, November 26, 2008

Trabalhadores seguros



Passou pelo voluntariado, foi um atleta de renome internacional que chegou às Olimpíadas. É jovem, lusocanadiano e deputado provincial. Foi Ministro do Turismo e é agora responsável pelo Ministério do Trabalho.
Na sua primeira entrevista exclusiva ao Nove Ilhas como Ministro do Trabalho, Peter Fonseca que começa a inteirar-se da complexidadde dos dossiers a ele reservados, mostra estar a levar a peito o novo cargo, talvez por ser-lhe muito próximo. Filho de trabalhadores portugueses, Fonseca conhece bem os sacrifícios e a importância do trabalho e a segurança para as famílias. Por isso quer diminuir o número de acidentes de trabalho – particularmente na construção civil – e assegurar que os trabalhadores conheçam os seus direitos para que se possam defender contra práticas ilegais levadas a cabo por alguns empregadores. No que diz respeito à construção civil, um sector muito querido dos imigrantes portugueses, Fonseca entre muitas outras acções apresentou já legislação para que todos tenham seguro.



Nove Ilhas - Depois do Turismo, que expectativas tem para este Ministério?
Perter Fonseca - É uma honra para mim ter sido esco-lhido para servir primeiro como eleito pelas pessoas de Mississauga e East Cooksville e depois como Ministro do Turismo e agora no Trabalho. O meu papel é servir de acordo com a vontade do primeiro-ministro. Estou muito contente por iniciar um novo desafio. O que fazemos nos nossos ministérios, basicamente é olhar pelas pessoas que são o nosso recurso mais valioso. Não somos como em Alberta que tem petróleo. Aqui na província temos pessoas e elas fazem um trabalho excepcional. O meu ministério tem a responsabilidade de manter as pessoas saudáveis e seguras. Queremos que o local de trabalho seja justo através de boas relações entre empregados e patrões. Vamos continuar o sucesso que temos tido na área do trabalho. Posso dizer que nos últimos cinco anos o número de acidentes de trabalho diminuiu em 20%. Este número significa que por causa das medidas que o governo implementou, 50 mil pessoas não tiveram um acidente de trabalho. Houve um grande impacto humano e fiscal com estas medidas, o que significa que se poupou aos contribuintes 5 biliões de dólares. Esta é uma acção positiva que irei continuar.

NI - Na prática que medidas espera implementar para reduzir ainda mais os acidentes de trabalho?
PF – Eu pretendo continuar a implementar o novo programa que acabamos de lançar “Safe at Work Ontario”. Com ele queremos ter uma atitude proactiva junto das empresas por forma a termos a certeza que podemos desenvolver estratégias junto dos empregadores que antecipem as situações críticas, antes que os acidentes ocorram. Vamos inspeccionar o que não está bem, antes que alguma coisa aconteça. Temos inspectores que são grandes profissionais capazes de fazer este trabalho com as empresas. O importante hoje é termos consciência da necessidade de trabalharmos num ambiente que é seguro e saudável e de implementarmos medidas para uma mudança substancial neste sentido. Junto das escolas estamos também a implementar desde o sétimo ano ao décimo segundo o programa “Live Smart Work Safe”. O meu primeiro emprego foi aos 14 anos e nesta idade eu não tive um programa como este nem tinha ideia dos meus direitos. É crucial que os jovens nas escolas saibam como se proteger de acidentes nos locais de trabalho. Por outro lado, quando estes jovens vão para o seu primeiro emprego – e existem muitos jovens portugueses a trabalhar – eles também podem ajudar o proprietário ou a organização onde trabalham a tornar o local seguro para todos. Ao compreenderem quais são os seus direitos estes jovens vão ser factores de mudança para o melhor sem medo de represálias e antes que um acidente decorra.

NI – Para além de assegurar que a curto prazo os locais de trabalho se tornem mais seguros como pretende mudar a cultura no local de trabalho?
PF – Queremos uma viragem cultural no local de trabalho. Algumas das melhores empresas que conhecemos têm tratado as questões da saúde e segurança no trabalho de uma forma bastante pragmática. Existem do mesmo modo algumas pequenas empresas que o têm feito de forma consciente. Estas são empresas fortes e que apostam em continuar a trabahar a longo prazo nesta província, por isso estão conscientes da necessidade de apostar em investimentos na segurança dos seus trabalhadores que no futuro trarão dividendos positivos importantes. Todavia, ainda temos muitas empresas que não entenderam a mensagem e que decidiram cortar nas despesas não apostando na segurança. Para estas empresas preparamos visitas pelos nossos inspectores que reforçam a lei e fazem com que as mesmas empresas concordem em aplicar as medidas que protejam os seus trabalhadores. Quero que em conjunto encontremos práticas mais positivas no sector da saúde e segurança. Esta é a situação que vim encontrar e cujo sucesso estou a analisar para dar continuidade e assegurar que podemos progredir nestas áreas.

NI - Para além destas questões, outros problemas afectam os trabalhadores: violência, trabalho em agências temporárias, receio de represálias do patrão se fizerem queixas e falta de informação sobre os mesmos direitos.
PF – Tenho alguns dossiers em estudo, alguns deles bastante ineressantes como é o caso da violência no local de trabalho. Houve consultas neste sentido com o meu antecessor e, estamos agora a estudar estratégias de mudança a nível governamental, para resolvermos estas situações. Já algumas pessoas morreram vítimas de violência no local de trabalho. Não tole-ramos violência no emprego e responderemos com celeridade logo que sejamos contactados em situações do género. Vamos tomar medidas para resolver estas situações.
Outra das áreas que estamos a olhar diz respeito às agências de trabalho temporário. Estas agências empregam cerca de 712 mil trabalhadores independentes. Esta é uma das outras áreas que queremos resolver analisando as razões que tornam os nossos trabalhadores vulneráveis. Queremos reduzir esta situação, assegurando que os trabalhadores tenham conhecimento dos seus direitos e que as leis sejam implementadas pelos patrões. Mesmo que empregando trabalhadores com problemas de língua as empresas são responsáveis por mater os trabalhadores informados dos seus direitos e devem saber onde se podem dirigir em caso de dúvidas. Tal deve aplicar-se também às agências de trabalho temporário.

NI – O medo de perder o emprego leva muitas vezes os trabalhadores – na sua maioria novos imigrantes – a recorrerem ao silêncio com receio de perderem o emprego.
PF – O medo de represálias é sempre uma questão a ter em conta, especialmente com tra-balhadores vulneráveis. Para que tal não aconteça queremos facultar os meios para que os trabalhadores saibam quais são os seus direitos e qual o processo a seguir, caso tenham necessidade de fazer uma queixa. Quero deixar a mensagem aos trabalhadores que não tenham receio de fazer vencer os seus direitos. O seu emprego está garantido, os seus direitos garantidos. Não podem ser despedidos porque fizeram uma queixa. Segundo a lei estão protegidos. Eu compreendo que é difícil para muitos tra-balhadores tomarem decisões por medo do que poderá vir a acontecer ao seu emprego. Mas eles estão seguros sempre que façam uma queixa ao ministério.

NI – Concorda com a necessidade de uma campanha mais abrangente junto das empresas e trabalhadores para que ambas as partes respeitem direitos e deveres, particularmente junto dos trabalhadores mais vulneráveis, nomeadamente imigrantes?
PF – Isto é o que pretendemos fazer juntos das agências de trabalho temporário que empregam muitos dos trabalhadores, na sua maioria desconhecedores dos seus direitos. Porque trabalham com muitas organizações diferentes é nossa intenção que estes trabalhadores e estas agências conhecem a lei onde se podem dirigir em caso de necessidade. Na maior parte dos casos, espero que os trabalhadores saibam quem contactar no nosso ministério quando tem dúvidas. O processo de fazer uma queixa foi também muito simplificado. Da papelada que era necessário, agora pode muito simplesmente recorrer à internet para fazer uma queixa, através do “Employment Standards Claims”. A queixa é feita pela internet e recebida em tempo real. Os nossos funcionários começam logo a investigar os casos que vão desde a falta de pagamento de ordenados, férias ou outros. No caso de segurança e saúde o trabalhador pode telefonar directamente ao ministério e, os nossos inspectores tomam logo conta do caso. Não precisa dar o seu nome ou informação pessoal. Uma chamada anónima é o suficiente para começarmos o processo de investigação.

NI – A construção civil é uma área onde os acidentes são uma preocupação. Este é um sector de grande importância para a comunidade portuguesa onde já existe um número significativo de vítimas de acidente. Que preocupações tem para o sector quando ainda há dias trabalhadores sofreram um acidente em condições atmosféricas difíceis. Por causa da crise, acha que se poderá entrar numa fase de descurar custos na segurança?
PF - Não queremos ninguém a “cortar caminho", especialmente na área da segurança dos trabalhadores da construção civil. Os nossos inspectores, que de uma forma pro-activa deslocam-se às empresas de maior risco e mais vulneráveis – nomeadamente trabalho nos telhados, electricidade, ou guindastes e gruas – tudo fazem para ter a certeza que os acidentes não acontecem.
Ao contrário do Turismo, uma das áreas mais difíceis para mim no Ministério do Trabalho, refere-se aos números. Todas as semanas em média recebo dois emails a dizer-me que alguém perdeu a vida a trabalhar. Esta tem sido a parte mais difícil deste trabalho: saber das fatalidades e como as resolver. Por ano acontecem na província 250 mil acidentes. Estamos os dois aqui a falar há 10 ou 15 minutos e neste espaço de tempo cinco incidentes já tiveram lugar. Cinco pessoas, em cada 10 minutos, sofrem um acidente. Muitos destes acidentes podem ser prevenidos e estamos a trabalhar na prevenção. Na construção fazemos o mesmo. Contractámos mais 130 inspectores na província para assegurar que na construção as áreas de maior risco são prioritárias. Posso dar-lhe um exemplo da acção preventiva que estamos a tomar. Na província temos 254 "cranes" a funcionar. O ano passado fomos inspeccionar este equipamento e tivemos que dar ordens de paragem para manutenção a 156 destes equipamentos. Infelizmente, nem sempre a mensagem de segurança chega à indústria. Por isso torna-se fundamental que tenhamos esta acção junto das empresas.

NI- Sei que recentemente tomou a decisão de mandatar a indústria para que todos os trabalhadores na construção tenham seguro. Quais as implicações desta nova legislação?
PF – A ser aprovada esta legislação vai através da WSIB cobrir todos os trabalhadores. Hoje em dia nem todos têm seguro. O problema é que – e tenho recebido muita gente nestas condições – sem seguro os acidentados, que não podem regressar ao mesmo tipo de trabalho, ficam numa situação muito precária. Estes traba-lhadores sofrem não só fisicamente, mas emocionalmente em conjunto com as suas famílias que se veem privadas dos meios de sobrevivência. Porque esta é uma profissão de alto risco queremos toda a gente segurada. No que diz ainda respeito à segurança financiamos, através da Work Place Safety and Insurance Board (WSIB), associações de segurança que se deslocam ao local de trabalho e junto dos trabalhadores das empresas sub-contratadas, ajudam os seus trabalhadores nas áreas da segurança permitindo que os mesmos tenham conhecimento da formação que precisam para a sua segurança pessoal.

alhadores ficam a saber exactamente o que devem fazer. Nos casos em que os nossos inspectores encontrem irregularidades as empresas que têm pessoas a trabalhar sem obedecer às leis de segurança são multadas. Como sabe no caso da construção as grandes companhias tem sub-contratos e há que ter a certeza que obedecem à lei.

NI – O que acha poder trazer de novo ao Ministério do Trabalho?
PF – Essencialmente o que eu gostaria de trazer é uma mudança na percepção cultural que existe no caso da importância da segurança e a saúde no local de trabalho. Estamos a investir em áreas que vão desde as escolas ao “site”. Temos uma comunidade muito diversificada e por isso quero ter a certeza que toda a gente – independentemente da língua ou cultura – seja conhecedora e consciente dos seus direitos como trabalhadores e que os patrões e as organizações que empregam pessoas sejam responsáveis. A formação para a segurança deve ser também contínua, pois as pessoas tem tendência a esquecer ou a “desleixar” um pouco as medidas de segurança. Estas são as áreas nas quais gostaria de deixar uma marca: incentivar uma cultura para a saúde e segurança e garantir que quem está a trabalhar numa área há muito tempo tenha formação contínua, para que as medidas de segurança continuem sempre frescas no dia a dia do trabalhador e que os novos tenham formação adequada.
Em época de crise a construção civil é sempre a que mais sofre. Muitos empregos na nossa comunidade dependem directa ou indirectamente da construção civil.

NI – Em época de crise a construção civil é sempre a que mais sofre. Muitos empregos na nossa comunidade dependem directa ou indirectamente da construção civil. O ministro das Finanças do Ontário anunciou 30 biliões para o sector. Acho que vamos ultrapassar a crise sem grandes efeitos na construção civil?
PF- O grande desafio para todos neste momento é a economia. Estamos numa época de grandes desafios. Há factores que não podemos controlar na província porque são factores externos. O que podemos controlar é o plano que estamos a pôr em prática para nos levar a bom porto durante esta fase e para que quando sairmos dela estejamos na dianteira. Assim o governo está a fazer investimentos, um dos mais importantes diz respeito à construção de infraestruturas na província, que nos vai possibilitar estarmos à frente de muitos outros quando a crise acabar. Queremos tornar a nossa província num local onde os indivíduos e as empresas se sintam bem. Assim estamos a financiar a formação de trabalhadores para termos uma força humana invejada pelos empregadores do exterior. Queremos mais jovens a terminar os seus estudos secundários. O nosso investimento vai para a educação e para a formação profissional contínua. Podemos controlar este plano interno a caminho do futuro para estarmos preparados para o fim da crise com empresas inovadoras, com jovens e trabalhadores com formação adequada, mantendo a inteligência e a inovação da nossa riqueza humana. Queremos estar preparados com novos produtos e serviços para manter o Ontário próspero e forte. Tendo em conta os desafios ambientais e económicos, queremos novos produtos nascidos destes desafios e que serão invejados no país e no exterior. Vamos criar condições para que os nossos trabalhadores sejam inovadores e que criem produtos e serviços novos. Queremos companhias do exterior a trabalhar no Ontário com as nossas pessoas que vão inovar e trazer respostas para os problemas actuais e do futuro. Neste processo a contrução civil e os serviços afins vai modernizar-se e preparar-se para os desafios do futuro. Estou confiante que vamos sair desta crise mais fortes e com respostas que o mundo vai precisar.
Humberta Araújo

Outono: estação dos sentidos












O Outono é sem dúvida uma estação para os sentidos. Deslumbrantes tonalidades pintam o horizonte a cada esquina. As mudanças de temperatura pincelam a cidade, enquanto as primeiras lareiras aquecem os serões e, as mesas ostentam sabores da quadra, que em cada cultura reserva receitas típicas, fruto da forma imaginativa com que aproveitam o produto da terra.



Para nós este é sem dúvida o período do ano em que a memória recria a tradicional vindima, o vinho doce, o figo e a abóbora.
Todavia, o Outono representa, pelo menos para mim uma renovação. No Outono regressava-se às aulas e à aprendizagem o que significava uma abertura ao mundo do conhecimento e ao engrandecimento pessoal. Toronto é sem dúvida uma bela cidade quando acariciada pelas tonalidades outonais.



Uma cidade de universidades de mérito, que incluíram nos seus programas estudos portugueses, o que espelha bem a importância que a nossa língua tem no mundo. E foi do português ensinado nas universidades da América do Norte que se falou em Toronto numa conferência organizada pelo departamento de português desta Universidade.



Durante três dias teve lugar uma análise da problemática do ensino universitário por diversos professores universitários a leccionar no Canadá e nos Estados Unidos. A temática, embora direccionada para as instituições de ensino superior, convergiu muito com o ensino básico e secundário. As experiências de muitos professores e os seus métodos estratégicos de ensino do português como língua estrangeira – que o é para a maioria dos alunos que frequentam aulas nas comunidades – foram infelizmente desperdiçadas pelos docentes não universitários de Toronto. Esta teria sido uma das poucas oportunidades de valorização profissional e de contactos para os professores comunitários. Não foi decerto por falta de convites da organizacão ou de publicidade nos orgãos de comunicação social.




As ocasiões para formação contínua, nomeadamente oficinas de trabalho ou palestras têm sido praticamente nulas. Por isso, qualquer oportunidade deve ser sempre aproveitada, mormente numa profissão onde as metodologias de ensino precisam de se adaptar aos novos tempos e às tecnologias existentes. O departamento de português da Universidade de Toronto está de parabéns.

Ensino da Lingua portuguesa


O português nas universidades da América do Norte foi um tema discutido durante três dias na Universidade de Toronto numa iniciativa do Departamento de português daquela instituição de ensino superior.
Um tema, que embora direccionado para as universidades, convergiu muito com o ensino básico e secundário. As experiências e modos de ensino de muitos dos professores presentes podem ser adaptadas a estratégias para o ensino básico e secundário, numa altura em que o ensino da língua portuguesa deve ser visto como o ensino de uma segunda língua requerendo formação especializada e contínua de professores, muitos deles seguindo um sistema que se encontra divorciado da realidade actual do ensino nas comunidades. Entre muitos temas tratados destaque para ensino da língua e aprendizagem, implicações do acordo ortográfico, língua e cultura fora da sala de aula, o papel da família na diversidade cultural, literatura portuguesa ao nível universitário, boas estratégias de aprendizagem, propósitos pedagógicos, português e brasileiro na sala de aula, material didáctico entre outros. Temas que para os académicos presentes possibilitou uma visão mais abrangente da situação actual e dos muitos caminhos a tomar para o ensino do português como língua estrangeira nas universidades.
A necessidade dos professores se manterem atentos às modificações pedagógicas do ensino do português só é possível “se os docentes tiverem interesse numa formação permanente e se ajustem aos desafios na sala de aula”. Como na altura foi defendido, “o professor não pode ser obrigadoa comparecer a simpósios ou oficinas. Todavia, uma das suas responsabilidades, como bom profissional é manter-se a par do que se passa na sua profissão e isto só é possível com uma formação profissional contínua e o aproveitamento de oportunidades, como esta em Toronto, onde as questões do ensino da língua portuguesa surgem”. 
Um dos desafios deixados neste fórum esteve relacionado com a necessidade da coordenação do ensino se envolver mais nas questões da formação contínua de professores, nomeadamente na organização de acções concertadas com apoio de especialistas na área das metodologias de ensino de uma segunda língua. 
Os trabalhos destes três dias de congresso incluíram intervenções de docentes da Universidade de Toronto, York, Brown, coordenadora do ensino de português nos Estados Unidos, e representantes da Associação dos Portugueses no Estrangeiro, Instituto Camões, Palcus e Congresso Luso Canadiano. 

Humberta Araújo

A crise e a comunidade


Os tempos são de reflexão. A economia de cada indivíduo está directamente relacionada com o país onde reside e a comunidade global. A nada somos indiferentes. Mesmo se a escolha fosse ignorar o que se passa à nossa volta seria impossível, pois muitos factores exteriores, influenciam o nosso dia a dia. Daí a actualidade de um seminário promovido pela Federação de Empresários e Profissionais Luso-Canadianos (FPCBP) para analisar a situação económica actual. Longe de fomentar o “desconforto”, esta iniciativa teve por mérito dizer de forma profissional aos seus membros que a contracção económica é uma realidade, que muitos sectores essenciais para a vida económica da comunidade vão de certo modo ser afectados, nomeadamente a construção civil, o crédito e a imobiliária. São para estas ocasiões que as associações profissionais servem, a par do trabalho constante feito anualmente de formação e informação daqueles que representam. Os portugueses estão preocupados, na maioria dos casos porque desconhecem – até os peritos têm dúvidas – na sua totalidade os factores que estão a influenciar a economia mundial, e consequentemente os seus empregos, as suas dí-vidas ou poupanças. Portanto, nada melhor do que estar informado sobre o que acontece à sua volta, compreender todas as facetas do problema e encontrar dentro do seu próprio meio fórmulas de encarar a crise e assim aliviar os seus impactos. 
Nestas circunstâncias, nada melhor do que as associações com representatividade comunitária chamarem a si a responsabilidade de fomentar a discussão e alargar a sua esfera de influência, saindo do mero jantar e baile para mergulharem em questões que afectam directamente a vida dos portugueses.
Sem conhecimento do que se passa será muito mais dificil encarar as dificuldades. Daí que importa expandir as actividades das nossas organizacões, para que assim possam melhor representar a comunidade e chamar a si um número mais atractivo de associados e amigos.

Friday, June 06, 2008

O Espírito e a Função também aqui


Cerca de seiscentas pessoas responderam à chamada da primeira Irmandade do Espírito Santo de Mississauga para a celebração do Pentecostes. Depois da missa, que teve lugar na igreja portuguesa de S. José em Oakville, o cortejo religioso deixou o templo, para dar início a uma curta procissão ao redor da igreja.
Os costumes populares estiveram bastante patentes em todos os aspectos desta celebração açoriana. Em alguns momentos do cortejo era possível reviver as imagens e os cenários da ilha: as coroas, os diálogos, a filarmónica, o choro de uma criança, as recordações de um idoso, o membro da filarmónica a descansar, a estreita canada delineada pelo arvoredo, o andor, a bandeira do arquipélago.
Como ditam os costumes deste festejo em louvor do Espírito Santo, depois de cumpridos os deveres religiosos, chegou o momento da confraternização e do alimento. O caldo, que há muitas horas vinha sendo preparado na cozinha da igreja pelas diligentes cozinheiras e ajudantes, era distribuído com mestria a todos, acompanhado das tradicionais carnes cozidas e depois a alcatra, o bolo e o vinho e refrescos. Uma mesa farta, que simboliza o espírito da dádiva e do quinhão. Aqui partilha-se o gosto pelo memorial, e o reviver de um povo que se reconhece, como nenhum outro, nos símbolos seculares do reinado do império: a coroa, a pomba e o estandarte. Equipados com os símbolos do poder terreno, o povo açoriano encontrou a sua fórmula para fugir ao esquecimento: o império do espírito.
E em Oakville foi possível uma vez mais reviver esta conquista.

Texto e fotos
Humberta Araújo













Quando a verdade incomoda

Recentemente a Aliança dos Clubes (ACAPO) responsável pela organização das festas da Semana de Portugal em Toronto, reuniu os órgãos de comunicação social e patrocinadores num encontro-almoço para dar a conhecer à comunidade o extenso e bastante diversificado programa das festividades da Semana de Portugal. Uma das grandes novidades desta edição 2008, que já fica conhecida pelo “Mês de Portugal” centra-se no facto desta celebração cultural portuguesa “saltar” a geografia do seu característico espaço sócio-cultural para se dar a conhecer aos canadianos não lusos. Assim, locais de grande valor turístico para o Ontário vão receber também a cultura portuguesa, nomeadamente o “Bata Show Museum”, o “Eaton Centre” entre outros.
O programa da Semana de Portugal já se tornou num acontecimento colectivo de grande valor para o calendário turístico da província e, já foi considerado, como a maior manifestação de portugalidade fora de Portugal.

A iniciativa foi agora contemplada com um apoio do governo da província através do programa “ Celebrate Ontário”, do Ministério do Turismo.
Os fundos públicos, que resultam dos impostos de todos os canadianos, entre eles os trabalhadores luso-canadianos, são propriedade pública e, como tal, devem ser disponibilizados sempre que sejam solicitados. Na conferência de imprensa fomos informados que a festa estava orçada em 400 mil dólares, montante que será coberto pelo generoso apoio de muitos patrocinadores portugueses e pelo Ministério do Turismo. Como qualquer jornalista profissional e interessado nos factos, solicitamos à ACAPO informações sobre o montante que a instituição vai receber do governo. À segunda tentativa, a sugestão foi a de que teríamos de perguntar ao Ministério do Turismo (!!!), uma vez que a informação faz parte do registo público e que como tal o ministério “teria muito prazer em facultar esta informação.” E assim fizemos.
A gentileza do ministro Peter Fonseca foi tal, que se deu ao trabalho de ligar à jornalista pessoalmente para providenciar todos os dados no passado dia 27. Assim sendo os portugueses e as associações - entidades públicas – ficam a saber que o governo vai dar mais de 73 mil e seiscentos dólares, os quais devem ser gastos em determinados sectores da Semana de Portugal, que garantem maior número de participantes, mais envolvimento na organização e presença de artistas e outros personalidades que enriqueçam a festa cultural portuguesa.
A “indisponibilidade" da Aliança em fornecer estes dados deixou igualmente o ministro surpreso, que fez questão de publicamente anunciar na cerimónia oficial da abertura da Semana de Portugal no consulado, o montante que o ministério disponibiliza para a festa portuguesa!

Thursday, June 05, 2008

O sucesso português

O abandono escolar português resulta de factores de ordem social e cultural. As estatísticas estão aí. Embora talvez gostássemos que as mesmas não surgissem nos orgãos de comunicação social canadianos, ou que fossem transmitidas primeiro à comunidade, o facto é que os números, bonitos ou não, são oficiais e compilados por organismos estatais ou pelos corpos governamentais das escolas públicas e católicas. Estes são números igualmente confirmados por diversos outros estudos feitos por investigadores universitários em Toronto, Montreal e Vancouver.
Os corpos directivos das escolas têm os seus ‘trustees’, membros escolhidos pelos eleitores, cujo papel é auscultar as suas comunidades e aconselhar os ‘boards’ das escolas. Estes ‘trustees’ – portugueses ou não - há muito que conhecem os números do insucesso escolar português. Porém, e ao que parece, alguns gostam de os camuflar ou esquecê-los. Quem sabe, talvez por incapacidade de trazer à mesa as razões para os números; ou porque não encontram, no seu pequeno mundo, as medidas concretas para abordar o paradoxo. E digo paradoxo, por considerar que por si só este não é um problema – é tão somente uma visão diferente de ver a vida e o sucesso, que não se integra na perspectiva da superioridade intelectual comungada por muitos. Esta visão transporta consigo o desafio de compreender e aceitar como válidas as percepções de riqueza, reconhecimento social e satisfacão pessoal. Há, portanto, a fazer um trabalho profundo, que passa por uma auscultação honesta, junto dos alunos, das famílias, dos ‘boards’ e dos governos. Os jovens portugueses – a maioria destes 43% da escola pública (a situção deve ser idêntica na católica, embora fôssemos informados pelo departamento das relações comunitárias, que os números não existem - têm uma percepção diferente do sucesso. Filhos de famílias operárias, por razões sócio-económicas decidem iniciar uma profissão cedo (algumas com salários bastantes apreciáveis, nomeadamente no ramo da construção civil, restauração e pequenas empresas afins), pois querem garantir os meios materiais, que suportem a sua percepção de sucesso, em parte herdada da família, que imigrou para fugir à pobreza. A este factor há que aliar o facto de muitos destes jovens casarem extremamente cedo e, na maioria dos casos, com membros da sua comunidade linguística, os quais comugam dos mesmos valores.

Estes jovens abandonam o sistema não para entrarem numa vida de delinquência (como se constacta nas jovens comunidades africanas), mas para seguirem uma via de sucesso que consideram honrosa e herdada das famílias.
Não podemos também ignorar o forte impacto que o sistema ditactorial teve em várias gerações de portugueses. Apesar de ter constituído um sistema obrigatório de aprendizagem até à quarta-classe, nunca incutiu nos portugueses uma percepção de sucesso individual, que decerto levaria, a incitar ao conflicto e ao desmoronamento do sistema suportado pelos pilares : “Pátria, Deus e Família.” Por outro lado, e reflectindo particularmente no caso insular, a exploração da terra pelos rendeiros e a subserviência aos senhores proprietários e aos seus filhos ‘meninos doutores’ não serviu para alimentar no povo o desejo de ‘mandar os filhos estudar para a cidade’ antro de perdição de valores. Enquanto que os ‘meninos doutores’ viviam do fruto do trabalho das famílias a quem arrendavam a terra, os outros jovens viviam a trabalhar de sol a sol, para garantir o mínimo de dignidade. Este fosso cravou na alma açoriana uma certa aversão ‘ao estudo, à cidade’, à vida dos donos da terra. Assim, a virtude do homem e da mulher que emigrou continuou enraizada na ética do trabalho, do amor à terra e do respeito mútuo. Tendo em conta estes factores, poder-se-á dizer que o abandono escolar português não está aí para o escondermos ou para nos humilhar. Deve servir sim, para que mostremos aos restantes ‘canadianos’, que temos percepcões diferentes do sucesso, e que os nossos jovens necessitam é que o governo do Ontário, juntamente com os conselhos directivos das escolas, os ‘trustees’, (sejam eles quais forem), em parceria com os alunos, as famílias e a comunidade encontrem os caminhos e os meios que possam responder às necessidades dos nossos jovens e da economia da província. O país e a província necessita de mais imigrantes. Vamos junto dos actores deste processo tentar saber como é que os jovens portugueses, já equipados de uma ética profissional e pessoal forte, podem apoiar a província no seu desenvolvimento, enquanto garantem uma visão de sucesso portuguesa. A terminar, uma palavra aos nossos ‘trustees’: os orgãos de comunicação social portugueses, entre eles o Nove Ilhas, são tão ou mais conhecedores das questões comunitárias, que o “Toronto Sun” ou a ‘TVO” expôs. A vossa comunidade é a comunidade portuguesa e, por isso, a ela devem em primeiro lugar responder, nomeadamente quando inquiridos pelos OCS. E por favor, não deixemos no ar a vaga possibilidade de uma escola lusocêntrica.

Humberta Araujo

Thursday, May 29, 2008

OS PORTUGUESES MUDARAM TORONTO

Tal como os pais, os jovens
portugueses dão valor ao trabalho




Entrevista e fotos
Humberta Araújo
Toronto

“A comunidade de língua portuguesa é vibrante, activa e integrada na cidade em áreas tão diversas como a cultura, os negócios e a política. É literalmente possível dizer-se que a comunidade portuguesa, foi uma das comunidades que construiu Toronto. Os portugueses foram muito activos no movimento sindical assegurando protecção aos trabalhadores. Numa perspectiva muito pessoal, recordo que a minha mãe ao vir para Toronto após ter vivido em Londres durante o “blitz” acabou por abandonar a cidade. A razão, segundo me disse, foi porque achou Toronto “desinteressante”. Esta situação mudou definitivamente a partir dos anos 50 e 60. Toronto tornou-se numa cidade dinâmica, viva e de sucesso. A comunidade portuguesa é uma das razões desta mudança. De uma cidade tipo presbisteriana, Toronto passou a ser uma urbe mais europeia, com charme e interesse. Sem dúvida que os portugueses contribuíram, enormemente para esta mudança."
Impostos para todos
Os membros da comunidade de língua portuguesa, tal como todos os outros cidadãos deste município contribuem para as finanças da autarquia e são afectados por toda e qualquer decisão do município. David Miller diz estar consciente da situação e que apesar dos apertos financeiros do orçamento camarário, que obrigaram à implementação de novos impostos, estas novas cargas fiscais não afectam os trabalhadores. "Com a integração de outros municípios, a cidade não possuía os fundos financeiros necessários para fazer aquilo que os seus munícipes esperavam. Desde esta altura – 10 anos ainda antes da minha presidência - que o município tem sobrevivido com dificuldade. Tivemos algum apoio do governo provincial de Dalton McGuinty, mas continuamos a ter problemas financeiros, em parte devido ao facto de o governo ter transferido para a câmara responsabilidades da província nas áreas dos serviços sociais e transportes, que agora devem ser pagos pela cidade. Os novos impostos foram para meter os nossos ‘livros’ em ordem. Posso dizer que este ano temos o nosso primeiro orçamento equilibrado. Assim pudemos conservar serviços essenciais para os cidadãos, entre eles os portugueses."
Consciente da polémica em torno do “Land Transfer Tax” Davi Miller continua a defender o novo imposto, considerando-o justo. “Na minha perspectiva este é um imposto equitativo porque atinge quem tem mais, financiando os serviços para todos. É também um imposto progressivo. Se tem uma casa que vale mais do que um milhão de dólares, o imposto cobrado durante a transacção reverte a favor da cidade. Obviamente, que esta pessoa paga substancialmente mais do que se a casa custasse 250 mil. Se a sua casa vale menos de 400 mil e é a primeira vez que concretiza uma transacção não paga nada." Na prática”assegura Miller “este imposto progressivo cobra aos que têm mais, em beneficio de todos e, especialmente dos que possuem menos. Acho que esta filosofia se adapta perfeitamente aos princípios dos canadianos e possibilitou-nos que preservássemos não só serviços actuais, como investíssemos em novos programas que as pessoas desejam.”

“Vamos ganhar o GST”
Para David Miller estas medidas fiscais “ajudaram muito” embora existam ainda algumas áreas a rever, nomeadamente na forma de funcionamento do imposto sobre a propriedade. “Este ano arrecadamos exactamente o mesmo montante de impostos que o ano passado, com excepção para os novos imóveis. Na prática, se num local o valor de uma propriedade subir e, consequentemente aumentar o total arrecadado pelo imposto, noutro local da cidade outra pessoa paga menos. Por esta razão recebemos o mesmo. Porém, as nossas despesas continuaram a aumentar, em parte por causa dos serviços que usam combustíveis. O combustível continua a subir, mas nem por isso os dinheiros da câmara aumentam. O “Land Transfer Tax”vai ajudar um pouco a ultrapassar esta situação, mas a longo prazo vamos necessitar, tal como acontece na Europa de termos um imposto de venda – “Sales Tax”. Por isso “salientou o presidente da câmara, “estamos a trabalhar muito na campanha "1 cêntimo do GST.” Miller considera que a luta da edilidade a favor desta fatia do GST está já a dar passos significativos para a sua institucionalização. “Registamos já nesta matéria algum progresso. Os Liberais e o NDP mostram muita sensibilidade para a nossa luta. O governo federal dos Conservadores não tem neste momento ainda opinião positiva sobre o assunto. De registar, no entanto, que no Outono passado em algumas cidades, o imposto sobre gás foi implementado. Acho que tal aconteceu porque o parlamento aprovou tal medida na sequência da mossa campanha pelo GST. Levou-nos 7 anos para termos o imposto sobre o combustível. Estamos a lutar por uma fatia do GST há um ano. Cedo ou tarde vamos ver o nosso desejo realizado porque esta é uma luta justa.”
A propósito dos fundos federais para as cidades, Miller relembrou a sua recente visita à China, onde constatou situações em que os municípios usufruem de importantes meios financeiros advindos dos impostos federais. “Acabei de vir de uma visita à China e o município que visitei recebe metade das receitas fiscais. Nós recebemos seis cêntimos por dólar. Não admira que a China esteja a investir.”
Apesar dos contratempos nesta campanha por uma fatia do GST, David Miller está optimista. “Iremos ganhar esta luta. Uma percentagem de 65% dos canadianos concorda com esta medida. E quando os canadianos concordam, eventualmente o parlamento acaba também por concordar”.

“Temos que seguir o exemplo europeu”
Miller vê na Europa muitos exemplos a seguir pelos governos centrais relativamente ao seu espaço territorial. “Quando olhamos para a Europa, através da União Europeia ou outros, verifica-se investimento. Na Europa vê-se investimentos nas infra-estruturas e nas pessoas. Nós aqui temos uma cidade moderna, excepcional e da qual estamos muito orgulhosos. Todavia, necessitamos de investir também. Temos por exemplo um projecto nos transportes. O “Transit City” pretende construir um sistema de transporte rápido por toda a cidade. Já conseguimos algum dinheiro da província e estamos já a começar a construir três novas linhas. Os estudos de impacto ambiental estão em marcha. Estes investimentos criam empregos, tornam a cidade mais atractiva para quem nela quer viver.” Miller exprimiu a sua admiração pelo sistema europeu, considerando que ele tem apoiado o desenvolvimento integrado das suas parcelas. “Temos que começar a pensar do mesmo modo e a apanhar o comboio da Europa e da China para começarmos a andar.”



Uma das questões levadas ao presidente da câmara esteve relacionada com o facto da "Sociedade Portuguesa dos Deficientes/Society of Portuguese Disabled Persons" estar há muito tempo a lutar pela isensão dos impostos pagos pela propriedade onde funcionam os seus serviços. Apesar de ter ganho uma batalha ao ver o imposto comercial ter sido substituído pelo imposto habitacional, a luta vai no sentido da instituição ficar totalmente isenta de impostos sobre a propriedade. Apesar de promessas de alguns conselheiros municipais que estariam a lutar pela isenção, Miller diz desconhecer completamente a questão, afirmando estar disponível para analisar o problema concreto e encontrar soluções para o estrangulamento financeiro da instituição. “Existem questões a ponderar nesta situação: Os impostos provinciais, tem regras especificas ditadas pela província.
Dentro das regras provinciais a municipalidade tem alguma mobilidade. Esta situação particular nunca foi posta à minha consideração. É sempre um desafio para nós quando as pessoas transformam uma propriedade com estatuto comercial para outros fins acarretando para o município perca de rendimentos. Todavia, temos algumas politicas que se referem directamente a organizações sem fins lucrativos. É sem dúvida possível que possamos olhar para esta situação particular. Não lhe posso dar pormenores sobre este assunto em particular, até porque pode haver algumas regras provinciais que se apliquem. Mas caso sejam regras autárquicas podemos olhar, em particular, a este caso.”
A questão da criação de uma escola afro - centrista no município e as elevadas percentagens de abandono escolar no seio da comunidade portuguesa foram outros assuntos tratados com o presidente da câmara. A propósito Miller declarou ao Nove Ilhas que “eu não mando nas escolas. Evidentemente que tenho as minhas opiniões pessoais sobre o assunto. A questão de uma escola afro - centrista no nosso município é da inteira responsabilidade do executivo das escolas públicas. Estou igualmente consciente da questão que se relaciona com o abandono escolar dos jovens portugueses em Toronto, mas estes são assuntos que nos ultrapassam.”
Questionado sobre a possibilidade do município trabalhar em conjunto com a província para, no caso português, incentivar o apoio a programas de aprendizagem nas áreas dos ofícios, Miller foi peremptório.
“Nós estamos a trabalhar num importante número de iniciativas, particularmente na área dos ofícios. O Ontário tinha um programa de aprendizagem muito bom, que não foi seguido e protegido da forma como devia ter sido. Nós, cidade de Toronto, estamos a trabalhar com o governo provincial e bairros no sentido de assegurar que existam sistemas de formação profissional não só na área dos ofícios – que sabemos paga bem - mas também nas artes, nos novos media, entre outros.
A comunidade portuguesa dá muito valor ao trabalho e é normal que os jovens sigam esta filosofia de vida. Acredito que a eles se deve apresentar um vasto campo de possibilidades. Confesso que estou preocupado com a área dos ofícios pois parece-me que não tem sido dada a atenção especial que merece. Eles são muito importantes, especialmente para a cidade de Toronto, uma cidade líder na construção e afins. Temos por isso que assegurar que a formação profissional existe para quem escolhe outras formas de vida.
Buracos nas ruas: 5 dias promete Miller
O Inverno foi um dos mais rigorosos dos últimos tempos e as estradas sofreram substancialmente. “O Inverno foi muito mau, mas estamos também a pagar pelo facto da cidade nos últimos 15 anos ter deferido trabalhos de manutenção por causa de problemas financeiros. Nos últimos dois orçamentos começamos a resolver esta situação. Estamos a aumentar os serviços de manutenção e garantimos aos munícipes cinco dias no máximo, para repararmos qualquer buraco que encontrem, logo que sejamos informados. Acho que pelo final da Primavera teremos feito um bom trabalho na reparação das vias e as pessoas vão ver um melhoramento nestes serviços.”

Todos com direito à informação
A cidade de Toronto tem serviços diversificados para apoio ao munícipe e está empenhada em prosseguir serviços para todos os cidadãos. Todavia, por questões de língua não chegam a todos os munícipes. Uma delas, por exemplo referiu Miller diz respeito a uma campanha a favor do controlo de armas – Gun Ban - que Miller está a levar a efeito, Miller reconheceu ao Nove Ilhas que a cidade não tem feito um bom trabalho de informação junto dos seus constituintes.
Todavia, com a recente aprovação de novos poderes para o presidente, Miller assegura que os portugueses, como outras comunidades, vão ouvir falar mais da sua cidade. “Temos trabalhado cuidadosamente para que os órgãos de comunicação social de todas as comunidades sejam informadas dos nossos serviços e do que acontece na sua cidade. Mas a verdade é que a cidade não tem feito o melhor que pode para manter todos informados, situação que se reflectiu por exemplo, o verão passado quando tivemos que fazer cortes nos serviços camarários, porque os novos impostos tinham sido deferidos. As pessoas ficaram surpreendidas por que desconheciam que a cidade funciona num sistema de governo 'pay-as-you’.”
Esta situação resultou, segundo David Miller da estrutura existente na qual “todo o conselho administrava a cidade e ninguém era responsável por levar a mensagem para o exterior. Agora tenho esta possibilidade legal de o fazer." E, numa altura em que a comunidade portuguesa se prepara para celebrar Portugal, David Miller no final da sua conversa com o Nove Ilhas, deixou um agradecimento especial a toda a comunidade de língua portuguesa "pelo seu trabalho e contributo na construção da identidade desta cidade de Toronto."
Texto e fotos: Humberta Araújo