Monday, November 12, 2007

O centralismo ainda continua vivo




Os tempos eram de uma doçura quente em que as tardes fluiam nas noites com a mesma ternura do velho que “coçava’ a terra para a tornar veludosa e fértil. As mãos dos nossos avós ostentavam os calos do sacho e os pés a sola natural de quem desde menino só conheceu sapatos para tomar a primeira comunhão. A terra pertencia ao senhorio que enriquecia às custas do trabalho árduo do rendeiro, que aproveitava cada milímetro de terra suada para fazê-la prenhe.
Os “meninos” do senhor das terras iam estudar para o continente, aquele lugar distante que tudo pedia da ínsula, mas nada dava em troca. E os mesmos “meninos”, depois doutores regressavam ao calor do lar para dos seus domínios e varandas olhar os vinhateiros, os homens “que davam os dias”, as mulheres que apanhavam do chão a fruta caída escondendo alguma para levar para casa, porque nem a fruta do chão o senhor permitia aos filhos dos pobres. A cada encontro na rua, o homem descalço de sacho ao ombro vergava-se à passagem do patrão, tirando o chapéu em sinal de subserviência e medo. Assim era a relação do ilhéu para com a nação distante. E esta atitude de servilismo imposto era alimentado pelas atitudes despóticas do estado-nação e dos seus intelectuais. Assim o tinha sido desde o tempo das capitanias, dos ataques da pirataria - que levou o grupo ocidental a pactuar com piratas como forma de sobrevivência, dado o completo abandono a que tinha sido votado pelas autoridades centrais. Assim continuou durante a era dos distritos, das ilhas adjacentes. Os arquipélagos não passavam de um pendão de oiro ao pescoço dos iluminados centralistas, que decidiam do centro sem nunca terem posto os pés nos arquipélagos. Enquanto as crianças açorianas e madeirenses eram obrigadas a decorar os nomes das cidades, capitais, rios e vales, monumentos e chefes de estado, ainda em finais da década de 70 jovens estudantes lisboetas acreditavam que se ia a pé de S. Miguel a Santa Maria durante a maré vazia. A autonomia veio valorizar a consciência açoriana e o nosso papel dentro do estado democrático português. Todavia, passados que são já 30 anos do 25 de Abril ainda há quem tenha receios da açorianidade.

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