Surpresa Agradável
Talvez por distracção minha, não identificava a Humberta Araújo com a poesia. Conheço-a de vista desde criança, pois somos da mesma idade e estivemos na mesma escola primária. Na mesma escola se se esquecer que, na realidade, estava dividida em duas: do lado esquerdo a das raparigas, do lado direito a dos rapazes. Embora o muro que separava os dois recreios fosse baixo, a verdade é que nem através dele nos era permitido olhar de um lado para o outro, já que a Senhora Contínua logo mandava dispersar. Nunca tive assim oportunidade de falar com a Humberta mas sei que era uma das raparigas do lado de lá do muro, pelo que penso que posso dizer que fomos colegas. Desconhecia era a sua veia poética e foi uma agradável surpresa descobrir hoje este seu poema numa revista:
SE ME PERGUNTARES SE TENHO SAUDADES
Se me perguntares se tenho saudades
Digo-te que há muito esqueci seu sal!
...mas depois soam as tuas gargalhadas...
...o touro negro na noite clara...
...as hortênsias engalanando a porta de madeira...
...o sol lambendo-me a pele nua...
...o anzol nas mãos em ferida...
...a erva queimada nas canadas incógnitas...
...o sino tocando as trindades morenas...
...as uvas negras brotando do cesto de vimes...
...o teu olhar triste em todos os dias do meu horizonte...
...mas se me perguntares se tenho saudades
digo-te que há muito esqueci o seu sal!
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